Fevereiro/2002

Seis Sigma

A ISO 9001:2000 E O DFSS (DESIGN FOR SIX SIGMA)

Norma Simons
Presidente da Simons White & Associates, Inc.(EUA)

Com a introdução da ISO 9001:2000, Sistemas de gestão da qualidade - Requisitos, a abordagem para implementação de sistemas de gestão da qualidade (SGQs) mudou. A ISO 9001:2000 estimula os usuários de SGQs a focalizar os processos da organização, e não mais a simples conformidade com os requisitos.

Sob essa abordagem, a organização é considerada e tratada como um sistema holístico, não como uma série de elementos separados, e a busca da satisfação de clientes internos e externos é considerada primordial para se agregar valor.

Para sobreviver no ambiente empresarial atual, as organizações precisam atender às altas expectativas do cliente de forma flexível e direcionada e exigir um maior desempenho geral com relação aos produtos e aos serviços.

Produtos sem defeitos não apenas são apreciados pelo cliente, como também considerados cruciais para a sobrevivência a longo prazo da organização, visto que o cliente estará sempre contando com esse tipo de produto. Não basta mais corrigir produtos após eles terem sido desenvolvidos, fabricados e/ou adquiridos pelo cliente, seja o cliente uma organização ou um consumidor.

O SGQ da sua organização não estará realmente em conformidade com os requisitos da ISO 9001:2000 - e certamente não estará voltado para as melhorias de desempenho apresentadas pela ISO 9004:2000, Diretrizes para melhorias de desempenho - se a organização se limitar a inspecionar a qualidade e focalizar a ação corretiva, para evitar que produtos não-conformes cheguem às mãos do cliente.

Atualmente, dá-se ênfase à rapidez e ao desempenho, sendo que a capacidade de projetar e implantar um processo eficiente de desenvolvimento do produto está se tornando uma grande vantagem competitiva.

A verdade é que o tempo de ciclo menor possibilita às empresas recuperar seus investimentos mais rapidamente e obter participação no mercado mediante o processo. Portanto, não basta mais fazer melhorias anuais de 5-10%. É preciso instalar sistemas e novas tecnologias e aplicar novas idéias que garantam um crescimento exponencial. Um SGQ eficaz e conforme com a ISO 9001:2000 precisará de ferramentas de sistema que materializem essas novas idéias.

Aplicando o Seis Sigma aos Processos de Projeto do SGQ

O Seis Sigma é uma filosofia da qualidade que foi primeiramente desenvolvida pela Motorola e reforçada por outras corporações inovadoras, tais como a General Electric e a Allied Signal. É uma abordagem de projeto que oferece uma coleção de ferramentas e técnicas para se desenvolver medições e identificar oportunidades de melhoria. O Seis Sigma utiliza medições focadas no cliente a fim de induzir a melhoria contínua em toda a organização. A filosofia Seis Sigma tem sido útil na identificação de causas-raiz e na implementação de ações corretivas e preventivas.

Calcula-se que algumas organizações atuam num nível entre dois e três sigma (308.700-66.810 defeitos por milhão de oportunidades ou DPMO), estando a média num nível um pouco melhor. Esses níveis indicam que existe um considerável desperdício na maioria das organizações, devido à variação de causas comuns e especiais em produtos e processos.

Contrastando com as outras, as organizações de nível Seis Sigma atuam a uma taxa de 3,4 DPMO. Embora muitas empresas tenham experimentado melhorias que resultaram em benefícios financeiros substanciais devido à implementação e ao uso do SGQ, está bastante evidente que elas precisarão se esforçar consideravelmente para obter os ganhos exponenciais necessários para passar de um nível sigma ao outro. Isso pode ser feito transferindo-se os conceitos do Seis Sigma para o estágio de projeto.

O Design for Six Sigma (DFSS) é uma abordagem rigorosa para o desenvolvimento de produtos e serviços que possibilita atender às expectativas do cliente antes mesmo da produção. As técnicas e os conceitos aplicados no desenvolvimento do produto e usados em toda a fase de projeto e desenvolvimento proporcionam os meios para passar de um nível quatro a um nível cinco, por exemplo, ou de um nível cinco a um nível seis de desempenho.

Uma melhoria de cinco para seis sigma representa uma redução de 30 vezes na baixa qualidade, enquanto que uma alteração de cinco para seis sigma resulta numa redução de 70 vezes na baixa qualidade. O DFSS complementa as melhorias do SGQ produzindo um impacto positivo sobre a confiabilidade e a mantenabilidade do produto.

O principal objetivo do DFSS é servir como uma metodologia para a criação de projetos que proporcionem eficácia a um baixo custo. As ferramentas e técnicas envolvidas no DFSS verificam se as escolhas que determinam processos e produtos sem defeitos são feitas no início do estágio de projeto e se há um conhecimento do impacto produzido sobre as operações e o cliente.

O resultado é o desenvolvimento de produtos/serviços robustos que reduzem ou eliminam a variação de processos. A estrutura do DFSS não envolve apenas o resultado do processo e o uso eficaz de recursos, mas também a criação e o uso de um sistema que possa ser empregado para vários produtos. Utilizando-se uma abordagem estruturada com um projeto robusto, o tempo para a chegada do produto ao mercado pode ser reduzido, resultando em uma maior lucratividade para toda a organização.

O Modelo de Seis Fases

Assim como um programa Seis Sigma completo, o DFSS também é direcionado para projetos. No entanto, a experiência da minha organização mostra que a implementação da abordagem DFSS pode ser melhor realizada se cada projeto for conduzido em seis fases. Cada fase exige o uso de ferramentas e técnicas específicas, que são integradas ao processo de desenvolvimento do produto.

Um dos principais pré-requisitos para um projeto eficaz é a existência de um processo estruturado de desenvolvimento do produto, tal como o processo obtido com a implementação de um SGQ conforme com os requisitos da seção 7, Realização do Produto, e especialmente das seções 7.3, Projeto e Desenvolvimento, e 7.5, Produção e Fornecimento de Serviço.

As atribuições e responsabilidades do pessoal envolvido no desenvolvimento do produto devem ser claramente descritas, e o pessoal deve ter conhecimento de todas as ferramentas necessárias para verificar se o produto atende aos requisitos especificados e aos objetivos da organização. Para cada produto ou serviço a ser projetado, desenvolvido e produzido, as seis fases do DFSS, discutidas abaixo, constituem uma seqüência da base fornecida pelos processos de SGQ, conforme observado acima.

Fase 1. Definir

A primeira fase do DFSS coincide com o desenvolvimento de um novo produto. Nessa fase, é necessária uma identificação apropriada do projeto, uma declaração de trabalho e o conhecimento do caso da empresa - por que é necessário um novo produto e o que ele deve fazer e/ou proporcionar.

Nessa fase, a organização deve lançar o fundamento para o novo produto. No início do processo de desenvolvimento, a "história" para o novo produto, que poderá ser descoberta em projetos e produtos anteriores, deve ser coletada e analisada, a fim de se desenvolver um referencial para o novo produto e aproveitar as lições aprendidas.

Uma equipe interfuncional é selecionada, as atribuições e responsabilidades são identificadas e os prazos do projeto são estabelecidos. Essa fase estabelece a base para o projeto todo e garante o uso eficaz das ferramentas de gestão de projeto que estão disponíveis ou serão necessárias para a equipe.

Fase 2. Medir

A segunda fase é crucial, pois determina o tom da avaliação da eficácia e eficiência do projeto DFSS. Dois tipos de medições são estabelecidos:

1. Medições relacionadas ao produto. Incluem as medições usadas para medir a conformidade do produto final com as especificações do cliente e outras especificações, quando o produto é lançado na produção total (ex.: peças defeituosas por milhão e rolled throughput yield), e as medições que medem a confiabilidade do produto (ex.: Tempo Médio Entre Falhas). Embora essas medições sejam usadas no final do processo de desenvolvimento do produto, outras medições relacionadas ao produto devem ser identificadas e implementadas nos principais pontos de análise crítica de projeto e desenvolvimento.

2. Medições relacionadas ao processo de desenvolvimento do produto. Essas medições dizem respeito à eficiência do processo de desenvolvimento do produto propriamente dito (ex.: tempo de ciclo das principais fases do processo de desenvolvimento do produto).

O objetivo de um projeto DFSS é melhorar o desempenho do produto e acelerar sua chegada ao mercado. As principais métricas devem incluir, portanto, uma avaliação do tempo de ciclo, do custo e do uso eficaz de recursos. A execução da Fase 2 é, normalmente, uma atividade curta, podendo ocorrer em combinação com a Fase 1.

Fase 3. Caracterizar

Enquanto as Fases 1 e 2 estabelecem a base para o processo, a Fase 3 focaliza o uso da ferramenta de Desdobramento da Função Qualidade (QFD) para se captar a voz do cliente. Em outras palavras, a organização deve projetar um produto que atenda às necessidades, especificadas e não-especificadas mas conhecidas, do cliente. Deve-se identificar e analisar as alternativas de projeto e selecionar uma opção que permita o alinhamento do projeto com os requisitos do cliente e com os objetivos da organização.

Ferramentas como a Análise de Valor também devem ser aplicadas, a fim de garantir que a equipe esteja consciente das oportunidades de redução de custo existentes, e as oportunidades possam então ser avaliadas para se determinar quais são viáveis e capazes de manter ou aumentar a qualidade do produto ou processo, ou satisfazer o cliente com menores custos. Essa fase estabelece as prioridades que servirão de foco para o projeto do novo produto.

Fase 4. Projetar

O foco da fase quatro é a identificação e redução de riscos em produtos e processos, de acordo com o programa de ação preventiva e os esforços de melhoria de desempenho do SGQ. A equipe interfuncional deve utilizar uma grande quantidade de ferramentas para identificar possíveis problemas e tomar as medidas necessárias para delinear falhas de produtos e/ou processos. Desenvolver para o produto um conjunto de características Críticas para a Qualidade (CTQs) é crucial, pois elas são distribuídas em todo o processo de desenvolvimento.

As CTQs são características mensuráveis e funcionais derivadas da voz do cliente. São conhecidas também como "resultados-chave", "Ys" ou "limites de especificação".

Durante essa fase, a organização deve também estabelecer planos para verificação e validação do desempenho do produto e predizer a capabilidade, a fim de garantir que os resultados de projeto atendam às especificações do cliente quanto às características do produto, satisfazendo, portanto, o cliente.

A combinação de técnicas DFSS, usadas no estágio de projeto com os procedimentos de projeto e desenvolvimento de produtos e processos, resultará em um projeto mais robusto, que estará sujeito a menos alterações de engenharia e menos problemas. Uma das metas de um projeto Seis Sigma é reduzir o número de alterações potenciais de um produto ou processo, bem como o número de possíveis problemas, visto que as próprias alterações podem resultar em mais defeitos.

Fase 5: Otimizar

O principal objetivo dessa fase é reduzir a variabilidade do produto e estabelecer predições de desempenho. Enquanto a fase anterior consistia na identificação das CTQs do produto, a quinta fase vai além e exige que a organização utilize várias outras técnicas de redução da variabilidade, a fim de reduzir a variação nos processos de produção e no produto. Ferramentas como o DOE - Projeto de Experimentos - são usadas para identificar fatores de controle - aqueles que produzem um impacto crítico na variação - que precisam ser monitorados e/ou controlados durante a produção de protótipos e produtos completos.

Fase 6: Verificar

A fase final do DFSS é empregada para se avaliar e verificar o desempenho do produto com relação aos requisitos do cliente. Os ensaios e planos para verificação de produto que foram desenvolvidos no estágio de projeto (Fase 4) são implementados e utilizados para avaliar o desempenho e fazer predições de confiabilidade. As atividades dessa fase devem ser concluídas antes do início da produção em larga escala e usadas para avaliar o desempenho do produto, comparando-o com as medidas referenciais estabelecidas na Fase 2 (medir).

Além disso, uma vez que tenha fabricado um produto ou prestado um serviço por um período de 4-6 meses, a organização deverá fazer medições do real desempenho do produto e dos processos de produção/serviço e documentá-los.

Esses dados referentes ao produto propriamente dito e às operações da organização relacionadas ao produto servirão como ponto de partida para as atividades de melhoria contínua, destinadas a aumentar o nível sigma da organização e de suas operações.

É possível implementar um programa DFSS antes de um programa Seis Sigma? Depende da preparação da organização. Se o SGQ existente na organização não estiver produzindo muitos defeitos/não-conformidades em produtos e processos, então é muito provável que a alteração necessária de cultura já tenha sido feita. Nesse caso, a organização seria bem-sucedida implementando um DFSS mesmo sem ter Black Belts treinados e prontos para levar adiante um projeto Seis Sigma.

Qual a Relação Entre a ISO 9001:2000 e o DFSS?

Um projeto DFSS eficaz depende de um processo bem-definido de projeto e desenvolvimento do produto. Conforme observado anteriormente, a ISO 9001:2000 fornece a base para o Seis Sigma e o DFSS, oferecendo um sistema de gestão orientado para o cliente e baseado em informações.

A lista de verificação abaixo compõe-se de algumas perguntas, sobre os elementos do SGQ, que a organização deve responder e seguir. Visto que é quase impossível implementar, manter e obter bons resultados a partir de um programa Seis Sigma sem um SGQ eficaz, esta lista deve ser usada para avaliar o nível de preparação da organização para embarcar em uma iniciativa de DFSS. Veja se a sua organização pode responder afirmativamente a cada uma das seguintes perguntas:

  • A organização estabeleceu um processo formal de planejamento para o desenvolvimento do produto?
  • Há um sistema bem-desenvolvido para identificação dos requisitos do cliente?
  • A organização tem algum método para identificar requisitos implícitos e não especificados do cliente?
  • Os requisitos de produto levam em consideração a conformidade com regulamentos governamentais?
  • Há algum processo formal para se analisar criticamente as exigências de um possível cliente quanto ao produto antes de se apresentar uma proposta?
  • Há algum processo para comunicação com o cliente no que se refere às informações do produto?
  • Há algum processo documentado de projeto e desenvolvimento de produto?
  • Há pontos documentados referentes à análise crítica de projeto e desenvolvimento?
  • Há requisitos e listas de verificação especiais para análise crítica e sign-off em cada ponto dos procedimentos de realização de produto da organização?
  • As atribuições e responsabilidades do pessoal principal envolvido na tarefa de projeto estão definidas?
  • As entradas relacionadas aos requisitos de produto estão devidamente definidas e documentadas?
  • Há algum processo de verificação de produto para garantir que as saídas de projeto e desenvolvimento atendam às entradas de projeto e desenvolvimento?
  • Os resultados de validação de projeto fornecem evidência de que o produto atende às exigências do cliente quanto ao desempenho?
  • Há algum sistema de medição que garanta a melhoria contínua do processo de desenvolvimento do produto?

Caso não possa responder sim a cada uma das perguntas da lista, sua organização deverá focalizar primeiramente a melhoria do SGQ, a fim de garantir a conformidade com a ISO 9001:2000 antes de levar adiante o DFSS. O DFSS será a solução apenas se a organização puder dar suporte a essa abordagem por meio do SGQ, e isso inclui, a longo prazo, tornar-se mais sensível às altas expectativas do cliente e fornecer, coerente e convenientemente, produtos de maior qualidade com tempos de ciclo menores.

É a partir daí que a organização poderá recuperar investimentos mais rapidamente e obter participação no mercado. Especialmente durante uma recessão, quando os clientes podem se tornar mais seletivos com relação aos seus fornecedores, e numa época de maior conscientização, quando os clientes do mundo todo querem garantia de que os produtos e serviços adquiridos serão devidamente eficazes e sem defeitos, é preciso um SGQ que exceda a simples conformidade com a ISO 9001:2000 e um DFSS para mostrar aos clientes que suas necessidades poderão ser satisfeitas.

Texto traduzido por Marily Tavares Sales, do QSP.