Agosto/1996

NOTAS EXPLICATIVAS SOBRE A BS8800

Francesco De Cicco
Diretor-Executivo do QSP

1) O Volume II do Manual sobre Sistemas de Gestão da Segurança e Saúde no Trabalho traz, fundamentalmente, a íntegra da nova norma britânica BS 8800, a qual foi traduzida para o português pela enga Ana Maria Iten, e por nós adaptada e ajustada à terminologia utilizada no Brasil, na área de Segurança e Saúde no Trabalho (SST). Esta publicação é, portanto, continuação da introdução ao tema, desenvolvida no Volume I do Manual.

Pretende-se, na seqüência, editar outros volumes do Manual, a fim de fornecer aos profissionais da área e às empresas em geral novas orientações sobre a implementação eficaz de Sistemas de Gestão da SST que, certamente, muito contribuirá para a redução de acidentes e doenças ocupacionais em nosso País.

2) Conforme a nós explicado pelo Sr. Allan Cawkwell, secretário do comitê que elaborou a norma britânica, foi alterada, de forma proposital, a numeração inicialmente prevista para essa norma, de BS 8750 para BS 8800, para evitar eventuais confusões entre um guia de diretrizes (como é o caso da BS 8800) e uma norma certificável (como as BS 5750 e 7750).

O quadro a seguir resume a situação atual das normas certificáveis e não-certificáveis para os Sistemas de Gestão da Qualidade, Gestão Ambiental e da Segurança e Saúde no Trabalho.

NORMAS VOLUNTÁRIAS SOBRE SISTEMAS DE GESTÃO
Características:
  • Não definem padrões de desempenho.
  • Requisito mínimo: as organizações devem atender a legislação pertinente.
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    NORMAS CERTIFICÁVEIS NORMAS NÃO-CERTIFICÁVEIS
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    ESPECIFICAÇÃO DIRETRIZES
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    ISO 9001/9002/9003
    ISO 14001
    ISO 9004-1 e 2 etc
    ISO 14004
    BS 8800 (ex-BS 8750)

    3) A nova norma britânica BS 8800, sobre Sistemas de Gestão da Segurança e Saúde no Trabalho, levou cerca de 15 meses para ser discutida e aprovada oficialmente; ela entrou em vigor no dia 15 de maio de 1996.

    Todo esse tempo foi necessário para que o produto final fosse, de fato, um compromisso que satisfizesse as aspirações dos empresários, trabalhadores, profissionais de Segurança e Saúde, órgãos regulamentadores, seguradores, entre outros.

    A BS 8800 é uma guia de diretrizes bastante genérico que se aplica tanto a indústrias complexas, de grande porte e altos riscos, como a organizações de pequeno porte e baixos riscos. Os pontos-chave que atendem as necessidades de todas as partes interessadas são que a BS 8800 auxilia a:

    • minimizar os riscos para os trabalhadores e outros;
    • melhorar o desempenho dos negócios;
    • estabelecer uma imagem responsável das organizações perante o mercado.

    Além disso, a BS 8800 é:

    • simples, de fácil leitura e sem jargões;
    • aplicável a qualquer organização, independentemente de seu tamanho ou natureza do negócio;
    • compatível com as Normas Regulamentadoras (NRs) do Ministério do Trabalho;
    • complementar a outros Sistemas de Gestão existentes e, idealmente, integrável às ISO 9001 e ISO 14001.

    4) No desenvolvimento da BS 8800, não havia modelos pré-estabelecidos para o Sistema de Gestão da SST. Entretanto, o comitê britânico responsável pela elaboração da norma, a fim de obter o consenso das partes envolvidas, desenvolveu duas abordagens para a utilização do guia: uma, baseada no HSE guidance - Successful Health and Safety Management - HS(G)65 (já adotada amplamente por várias indústrias do Reino Unido), e outra, baseada na ISO 14001 sobre Sistemas de Gestão Ambiental. A orientação apresentada em cada abordagem é essencialmente a mesma, sendo a única diferença significativa a ordem de apresentação.

    A abordagem que escolhemos para ser apresentada neste Manual está baseada na ISO 14001, por ser ela uma norma internacional.

    5) Como a BS 8800 pode ser melhor utilizada?

    A resposta a essa pergunta depende da organização, de seu tamanho, da natureza de seu negócio, de sua complexidade e sofisticação em relação ao seu atual Sistema de Gestão da SST.

    Para organizações sem nenhum sistema implantado (ou pouco implantado), recomenda-se a realização de uma análise crítica inicial da situação. Com isso, pretende-se que elas saibam o que deveriam estar fazendo, onde se encontram atualmente, e o que precisam fazer imediatamente para identificar perigos e para avaliar, priorizar e controlar riscos. Se não houver um Sistema de Gestão da SST adequado, é essencial que a organização comece a controlar, no curto prazo, seus riscos maiores, e a utilizar a parte central da BS 8800 para refinar seus controles e melhorar continuamente, no longo prazo, o desempenho da Segurança e Saúde, baseando-se no monitoramento pró-ativo sugerido no guia.

    A parte central da BS 8800 dá o contorno de todos os elementos-chave de um Sistema de Gestão da SST. Os detalhes, nessa parte do guia, são insuficientes por si sós para permitir a uma empresa principiante implementar seu Sistema de Gestão. Ela fornece a estrutura - diz o que fazer, ao passo que os anexos da norma fornecem os detalhes sobre como implementar os vários elementos do sistema - diz como fazer.

    O enfoque da BS 8800 é simples e não está carregado de jargões ou conceitos complexos sobre Segurança e Saúde. É reconhecido, entretanto, que os especialistas dessa área podem ter um papel de apoio importante para direcionar certas questões.

    Para organizações mais sofisticadas ou que já tenham um sistema implantado, a parte central da BS 8800 deve ser-lhes mais útil, podendo então o guia ser utilizado como um checklist, para apontar eventuais deficiências existentes em seu Sistema de Gestão da SST.

    Os modelos que a BS 8800 fornece permite às empresas estruturar seu sistema de SST de tal forma que ele possa ser convenientemente "acoplado" aos Sistemas de Gestão da Qualidade e de Gestão Ambiental.

    6) A introdução do guia reconhece o custo para as organizações das práticas deficientes de Segurança e Saúde, e reforça a necessidade de que sejam devidamente consideradas as diversas partes interessadas no desempenho da empresa, incluindo:

    • funcionários;
    • contratantes;
    • consumidores/clientes/fornecedores;
    • órgãos regulamentadores e fiscalizadores;
    • a comunidade;
    • acionistas;
    • seguradores.

    As primeiras quatro seções da norma cobrem: escopo, referências informativas, definições e os elementos essenciais do sistema. São seções curtas e simples.

    Os elementos essenciais do Sistema de Gestão da SST compreendem:

    Análise Crítica Inicial da Situação

    Como já mencionamos, essa etapa-chave é, via de regra, para organizações que ainda não tenham estruturado adequadamente seu sistema. O objetivo aqui é analisar criticamente as ações que a empresa desenvolve e a adequação das mesmas em relação a:

    • requisitos da legislação de SST pertinente;
    • orientações já existentes na organização;
    • melhores práticas e desempenho do setor da empresa;
    • eficiência e eficácia dos recursos existentes.

    Política de SST

    O comitê de elaboração da BS 8800 dispendeu muito tempo nessa seção, para identificar as características-chave e as palavras mais apropriadas, e obter o consenso entre os participantes. O resultado foi a produção de 9 características que devem estar evidentes em uma política consistente de SST:

    • reconhecimento de que a SST é parte integrante do desempenho dos negócios;
    • comprometimento com um alto nível de desempenho e melhoria do custo-eficácia;
    • fornecimento de recursos adequados e apropriados;
    • estabelecimento e publicação dos objetivos;
    • colocação clara da gestão da SST como responsabilidade dos gerentes de linha;
    • comprometimento para que a política seja entendida e implementada;
    • envolvimento e consulta aos funcionários;
    • comprometimento com análises críticas periódicas (pela administração);
    • compromisso de que todos os funcionários recebem treinamento apropriado.

    Organização

    A maior parte do conteúdo da BS 8800 está em seus anexos. Diretrizes são dadas sobre as responsabilidades individuais e sobre a necessidade de:

    • ter acesso ou ter competência suficiente em relação à SST;
    • definir a alocação de responsabilidades, inclusive financeira;
    • assegurar que as pessoas tenham a autoridade necessária para cumprir suas responsabilidades;
    • alocar recursos adequados;
    • identificar as competências necessárias e organizar os treinamentos pertinentes;
    • tomar providências para uma comunicação eficaz;
    • adotar medidas para obter o aconselhamento de especialistas em SST;
    • tomar providências eficazes para o envolvimento dos funcionários.

    Planejamento e Implementação

    O guia indica a necessidade de planejar e mensurar os elementos mostrados na figura da página 19. As atividades previstas incluem:

    • plano global e objetivos que atendam a política de SST;
    • identificação de perigos e avaliação de riscos;
    • plano operacional;
    • plano de contingência;
    • planejamento das atividades organizacionais;
    • planejamento da mensuração do desempenho, auditorias etc;
    • implementação de ações corretivas.

    Mensuração do Desempenho

    As principais recomendações desse item da BS 8800 são:

    • estabelecer meios para a medição quantitativa e qualitativa do desempenho da SST;
    • implementar medidas pró-ativas;
    • implementar medidas reativas.

    Auditoria e Análise Crítica

    As seções finais do guia abordam os processos de auditoria e de análise crítica. A auditoria é um exame sistemático para determinar se o sistema existente está em conformidade com padrões e normas definidos. A análise crítica (pela administração) tem por objetivo avaliar se o sistema está funcionando adequadamente, de acordo com as expectativas da organização em relação ao desempenho da SST. Sua importância está em facilitar a adoção de medidas pró-ativas e em assegurar que sejam convenientemente considerados e planejados os efeitos de mudanças tecnológicas, da legislação, de métodos de trabalho etc.

    7) Teremos uma "ISO 18000"?

    Diversos países têm manifestado interesse para que a ISO - Organização Internacional para a Normalização - desenvolva normas internacionais voluntárias sobre Sistemas de Gestão da Segurança e Saúde no Trabalho (possível série "ISO 18000", ou qualquer outro número que lhe for atribuído).

    A fim de avaliar a necessidade de se elaborar tais normas, a ISO programou um workshop internacional, em Genebra, Suíça. Diversos países, o Brasil inclusive, estão realizando eventos preparatórios, com o objetivo de esclarecer e consolidar suas posições sobre o assunto.

    Em alguns países (como a Grã-Bretanha, que recentemente aprovou a BS 8800), as normas sobre Sistemas de Gestão da SST já estão bem encaminhadas, o que, por outro lado, poderá contribuir para a proliferação de normas mutuamente incompatíveis, refletindo uma possível necessidade de normas internacionais globais.

    Normas ISO sobre SST permitiriam encontrar soluções harmonizadas para a gestão da prevenção de acidentes e doenças ocupacionais, evitando assim que requisitos divergentes possam emergir ao nível de países ou regiões. Algumas importantes economias industrializadas estão aguardando o resultado desses workshops, antes de tomarem uma decisão sobre a direção a seguir em relação à normalização nessa área.

    As principais vantagens que têm sido apontadas para justificar a existência de normas internacionais sobre SST são as seguintes:

    • Uma norma que encoraje uma abordagem sistêmica sobre o tema pode melhorar o desempenho na área de Segurança e Saúde no Trabalho;
    • Uma norma internacional pode proporcionar uma base e uma linguagem comum para os Sistemas de Gestão da SST, auxiliando as empresas a estabelecer uma plataforma universal para tratar e comunicar as questões sobre o tema;
    • Uma norma pode auxiliar as empresas a administrar os riscos e as responsabilidades associadas às questões de SST;
    • Uma norma pode se tornar um veículo de redução de custos na área de Segurança e Saúde no Trabalho, evitando, por exemplo, danos, perdas e doenças, reduzindo assim os custos de produção;
    • Uma norma pode propiciar oportunidades para a implementação de abordagens reguladoras (legais) mais flexíveis para as questões de Segurança e Saúde no Trabalho, em todo o mundo;
    • Uma norma sobre gerenciamento da SST consistente com as ISO 9000 e ISO 14000 pode promover uma abordagem integrada para as questões de qualidade, meio ambiente, segurança e saúde.

    É esperar para ver.

    8) Perigo e Risco

    Há quase 20 anos, temos traduzido os termos hazard e risk como risco, e danger como perigo. Obviamente, cada um com seu respectivo significado, o qual, aliás, coincide com as definições da BS 8800.

    Entretanto, a fim de possibilitar aos leitores de nosso Manual um entendimento mais claro desses termos, optamos por adotar a seguinte tradução:

    hazard = perigo
        risk = risco

    sem alterar, é claro, o significado e a conceituação que sempre defendemos (mesmo porque na BS 8800 não é feita nenhuma referência ao termo danger).