Sistemas Integrados de Gestão
Fevereiro/2001

O CASO DA 3M / ITAPETININGA

Luiz Cláudio Micheloni da Silva
Supervisor de Qualidade Assegurada da Fábrica de Itapetininga da 3M do Brasil

1- Introdução

Vivemos em um mundo em que a velocidade de informações é cada vez maior, e esta troca constante de habilidades, conhecimentos e inovações tecnológicas nos levou a uma evolução natural da qualidade de vida dos seres humanos, e que justificam o aumento do número de materiais e substâncias conhecidas, tanto no campo das indústrias quanto no campo da medicina e informática, entre outros. Estes avanços trouxeram consigo novos problemas econômicos, sociais, políticos, ambientais, de segurança e saúde no trabalho, e ainda novas demandas de recursos naturais disponíveis. Desta forma a opinião pública está ficando cada vez mais sensível às questões de segurança, de qualidade e de meio ambiente, assim a competitividade das empresas começou a ser afetada, pois são vários os fatores motivacionais que as levam a adotar medidas de proteção ao meio ambiente, de seus funcionários, de sua comunidade, de seus clientes, de seu patrimônio, enfim, dos stakeholders. O senso de responsabilidade ambiental, civil, social, as exigências legais, a proteção dos interesses da empresa, a proteção à sua imagem, a proteção de seus funcionários, as pressões constantes do mercado, a luta por melhor qualidade de vida e por fim o lucro, formam o conjunto de fatores que podem e devem levar uma empresa a adotar Sistemas de controle e principalmente de melhoria de suas atividades. Com base neste cenário, a fábrica de Itapetininga da 3M do Brasil Ltda, resolveu implementar os Sistemas de Gestão baseados nas Normas ISO 9002 ( versão 1994 ), na ISO 14001 ( versão 1996 ) e no Guia BS 8800 ( versão 1996 ), nomeando-os de Sistema Integrado de Gestão ( SIG ).

2- A Empresa

A 3M do Brasil Ltda. é uma Indústria Química de Processos, de Origem Norte Americana é uma subsidiária da 3M Company , contando hoje com três Fábricas - Sumaré ( Matriz ), Ribeirão Preto ( Fábrica 2 ) e Itapetininga ( Fábrica 3 ) - além de filiais de vendas em todo o País. Só no Brasil são fabricados 1000 produtos diferentes, que representam 25 mil itens, que atendem a quarenta segmentos de mercado, entre eles: Indústria, transporte, construção, eletricidade e eletrônica, comunicações, educação, segurança, medicina e saúde, escritórios e casas - produtos para consumo em geral.

3- A Fábrica

Especificamente na fábrica de Itapetininga, parte da Divisão de Fitas Adesivas e Produtos Correlatos, são produzidos itens para Segurança (máscaras e ear plugs), produtos para Sistemas de Empacotamento (fitas de empacotamento), produtos de consumo industrial (tratamento de papel) e produtos para fraldas descartáveis (frontal tape). É uma unidade que iniciou suas atividades em 1984, e que conta hoje com 550 funcionários, distribuídos entre setores produtivos e administrativos.

4- Percurso de Implantação

4.1- Histórico

Iniciamos os trabalhos de implantação do Sistema de Qualidade em 1992, usando a unidade de protetores auriculares (ear plugs) como projeto-piloto. Obtivemos um resultado altamente positivo quando da sua certificação pela ISO 9002 em outubro de 1993. Devido aos ganhos obtidos em relação a redução de não conformidades e reclamações de clientes, a empresa resolveu estender a implantação da norma a todos os setores. Iniciamos as atividades de implantação em 1994 e certificamos todo a fábrica em novembro de 1996. Em 1997 registrávamos um número crescente de acidentes de trabalho, apesar dos programas de redução implantados em todas as unidades e da atuação enérgica de nossa CIPA. Havíamos criado um programa de redução de acidentes, chamado de Plano PAZ (Programa de Acidente Zero), que premiava as áreas onde não ocorriam acidentes e que trouxe excelentes resultados nos dois primeiros anos de existência. Criamos o programa de relato de Quase-Acidentes, mas este também trazia o problema de que ainda estávamos sendo reativos, uma vez que todo e qualquer quase-acidente é uma situação em que o risco já está instalado e, portanto, qualquer correção é reativa. Após estabelecermos esses programas que traziam resultados imediatos, mas reativos, concluímos que deveríamos adotar uma forma sistemática totalmente pró-ativa de atuação em relação à segurança, pois as situações de risco repetiam-se com o passar do tempo. Havia ainda na empresa um Guia de Segurança, composto por 34 requisitos com pontuação, que eram verificados por nossa área internacional de segurança. Os requisitos eram bastante complexos e de difícil entendimento, pois foram criados por nossa matriz nos Estados Unidos, uma realidade bastante diferente da nossa. A área de Segurança e Saúde no Trabalho estudou o problema, as normas e os guias existentes que poderiam nos auxiliar e concluiu que o melhor seria seguirmos o Guia BS 8800, apesar de não ser possível a certificação, no máximo uma validação. Além do que, com a implantação do Guia, estaríamos iniciando o cumprimento dos 34 elementos corporativos de segurança e saúde no trabalho.

4.2- Por que integrar?

Passamos então a estudar o Guia e, para cumprir o requisito de análise inicial do sistema, contratamos o QSP. Além dessa análise, o QSP mostrou-nos que poderíamos estar agregando mais valor à nossa empresa e conseqüentemente a nosso sistema se também implantássemos a norma ISO 14001, uma vez que os requisitos das duas normas são compatíveis e já tínhamos a base da ISO 9002. Nossas análises levaram ainda em consideração que o fato de estarmos implantando os sistemas de meio ambiente e de segurança e saúde no trabalho seria uma forma de estarmos fundamentando dois de nossos principais valores: Respeitar o Ambiente Físico e Social e o de ser Uma Empresa Onde Seus Funcionários Tenham Orgulho de Trabalhar.

4.3- Como ocorreu a integração?

Resolvemos então que faríamos a implantação dos sistemas em duas fases distintas: 1ª Fase: Implantação dos Sistemas de Meio Ambiente e Segurança e Saúde no Trabalho, chamando-o de Sistema Integrado de Gestão (SIG); 2ª Fase: Integração do Sistema da Qualidade ao SIG, com base na versão DIS da ISO 9000:2000, fazendo desta forma a integração total dos sistemas.

4.3.1- Dificuldades

A seguir estão descritas as dificuldades e facilidades encontradas no desenvolvimento da integração, dividindo-se nas duas fases distintas que tivemos.

4.3.1.1 - Dificuldades encontradas na 1ª fase

» A complexidade da documentação corporativa da empresa, pois somos uma organização com 3 fábricas e temos vários procedimentos interligados, alguns eram repetitivos e complexos e muitos deles não eram aplicáveis ao sistema que estava sendo proposto;
» A mudança de comportamento relacionada às questões de meio ambiente foi outro fator que dificultou bastante o andamento dos trabalhos, pois pela nossa natureza de operação já possuíamos uma consciência maior em relação à segurança, mas quanto ao meio ambiente tivemos que desenvolver um trabalho sério de conscientização dos funcionários dentro e fora da empresa. Para atingir nossos objetivos fizemos campanhas, ensinando-os que não bastaria preservar o meio ambiente apenas na fábrica, mas também em suas casas e suas comunidades;
» O envolvimento de todos os funcionários e terceiros na implementação foi outro fator, pois alguns deles não conseguiam enxergar os benefícios e acreditavam que seria mais uma burocracia a cumprir;
» O levantamento das legislações aplicáveis foi muito difícil, considerando sua complexidade. Acabamos descobrindo que muitas leis não são seguidas por desconhecimento (apesar de não podermos alegar ignorância frente a elas ), pois as leis ficam na esfera jurídica das empresas, e nós que estamos ligados aos departamentos produtivos, e por conseqüência "poluidores", não temos conhecimento de diversas infrações que poderiam ser evitadas com ações simples. Para facilitar o levantamento, assinamos um contrato com uma empresa de advocacia que nos forneceu um CD-Rom com as legislações federais e estaduais, o qual é atualizado com freqüência;
» O levantamento de aspectos/impactos, perigos/riscos pode ser classificado como de maior dificuldade, pois o entendimento conceitual foi uma enorme barreira a vencer. Para que todas as áreas/departamentos tivessem o mesmo nível de conhecimento, foram necessárias diversas reuniões e treinamentos. Além do que a dinâmica das áreas e mais o aprofundamento dos conceitos fez com que os levantamentos fossem discutidos e refeitos inúmeras vezes.

4.3.1.2- Dificuldades encontradas na 2ª fase

» O entendimento da equipe de integração, em relação à definição do que era integração e do que era adequação do sistema da qualidade com o já implantado SIG;
» O curto espaço de tempo para realizar a integração total dos sistemas, uma vez que a data prevista era menor do que um ano. Parece um prazo razoável, mas a equipe é composta de pessoas que trabalham em diversos departamentos e possuem atividades bastante diferenciadas, e com várias responsabilidades além da integração, o que dificultou o andamento do projeto;
» O entendimento conceitual da nova versão da norma, uma vez que trabalhamos com a versão DIS (Draft International Standard), e como não estava bem difundida e entendida, as interpretações foram as mais diversas e difíceis possíveis;
» A realização de auditorias internas, pois a equipe de auditores possui formações diferenciadas em qualidade e em SIG.

4.3.2- Facilidades

4.3.2.1- Facilidades encontradas na 1ª fase

» A definição da Política Integrada, pois sendo totalmente nova não havia paradigmas a serem quebrados e tínhamos o aval da empresa para criar;
» Acriação da ferramenta SGM (Sistema de Gestão de Manufatura) em Lotus Notes, onde alocamos todos os projetos da fábrica, com metas comuns, criando dessa forma o nosso programa de gestão para atender ao requisito normativo;
» A alocação de procedimentos em rede trouxe a facilidade de distribuição e controle dos documentos, pois acabamos com o problema de cópias controladas e todo o trabalho adicional agregado;
» A integração da equipe de implantação, pois todos trabalharam realmente com espírito de equipe, não medindo esforços para a realização das tarefas.

4.3.2.2- Facilidades encontradas na 2ª fase

» A adequação da nossa Política da Qualidade ficou facilitada, uma vez que a nova versão da ISO 9000 exige os itens que já estavam descritos na anterior;
» A descrição dos novos procedimentos, por serem
em número menor. Apesar de não descartarmos os que estavam em vigor, fizemos um realinhamento dos mesmos;
» A organização da equipe, que, apesar do curto espaço de tempo disponível para executar um trabalho tão grande, venceu mais esta etapa;
» O apoio da alta administração, que sempre esteve ao nosso lado, colaborando tanto na participação direta e ativa, quanto na disponibilização dos recursos.

5- Integrado ou Não Integrado?

Podemos afirmar que existem atividades e requisitos que realmente funcionam integrados e outros que não funcionam, seja por suas finalidades e objetivos, seja porque simplesmente não são compatíveis e não são contemplados pelas normas e pelo guia. Abaixo estão descritas as duas situações que hoje estamos enfrentando:

5.1- O que Realmente Funciona Integrado

O Controle de Documentos, que em nosso caso está em rede eletrônica;

Treinamento, Conscientização e Competência. O procedimento é único e contempla os três Sistemas;

Programa de Gestão, onde estão relatados todos os projetos da fábrica, ligados a metas claras e de conhecimento de todos;

Ações Corretivas e Preventivas. O procedimento é único e busca a melhoria contínua dos Sistemas;

Objetivos e Metas. Definidos dentro de nosso Programa de Gestão;

Análise Crítica. São realizadas reuniões únicas quadrimestrais com os membros e a alta administração da fábrica, o que permite um bom monitoramento do sistema;

Manutenção. O procedimento é único, contempla as calibrações e manutenções exigidas; é realizado pela mesma equipe do departamento de Engenharia, atendendo a todos os outros setores da fábrica.

5.2- O que Ainda Não Funciona Integrado

Levantamento de Aspectos/Impactos e Perigos/Riscos, por serem requisitos específicos;

Auditorias Internas. Apesar de estabelecermos um único Manual de Auditorias, os checklists são diferentes e os controles de realização têm que ser relatados diferenciados, pois facilitam o entendimento das auditorias externas. Atualmente para ser um auditor-líder em SIG, estamos exigindo a realização do curso de auditor-líder em SIG realizado pelo QSP;

Auditorias Externas. Os auditores dos organismos certificadores ainda não estão totalmente preparados para executarem uma auditoria integrada, mesmo porque só existe o curso citado acima para a formação e este ainda não é reconhecido;

Não-Conformidades. Ainda não conseguimos estabelecer um procedimento único, com apenas um modelo de ficha para relato das não-conformidades; portanto, temos um procedimento para a Qualidade e outro para contemplar os outros sistemas.

6- Vantagens

Sem dúvida alguma, o SIG traz várias vantagens, das quais podemos relatar as seguintes:

O fortalecimento do trabalho em equipe, pois há um melhor comprometimento das áreas e uma maior troca de experiências em toda a fábrica;
A padronização, a redução e a simplificação de documentos é uma das conquistas, pois facilita o entendimento dos envolvidos, facilita o treinamento e, o mais importante, permite a redução do número de cópias emitidas para a fábrica;
Está havendo um maior comprometimento das áreas envolvidas com o SIG com as estratégias da empresa, pois com a criação do Sistema de Gestão de Manufatura temos a oportunidade de relatar todos os projetos em um único fórum de discussão e atuação;
Estamos alcançando um estágio de melhoria contínua do nosso desempenho como nunca vimos antes, pois a preocupação é constante e o benefício de ter um sistema integrado alavanca oportunidades de melhoria diferenciadas e muito maiores que se estivéssemos com sistemas separados;
Passamos a ter um maior controle sobre nossos resíduos e, conseqüentemente, tivemos que aumentar o controle sobre as perdas e materiais não-conformes, aumentando portanto nossa eficiência produtiva;
Melhoramos a imagem da fábrica em relação à 3M Company, pois somos a primeira fábrica da 3M no mundo que possui os três sistemas integrados;
Melhoramos a imagem da empresa em relação à comunidade;
Reduzimos o custo das auditorias de manutenção, pois como estas ocorrem de forma ordenada e na mesma época a quantidade de horas empregadas é menor;
Com o melhor gerenciamento, reduzimos o consumo de energia;
Reduzimos o número de acidentes na fábrica, que era o nosso foco inicial;
Estamos de acordo com as exigências legais, o que nos torna menos vulneráveis a fiscalizações.

7- Desvantagens

Uma integração desse porte, a princípio, não deve trazer desvantagens, pois envolve um planejamento bem estruturado e uma canalização da energia necessária para viabilizá-la. Portanto, podemos dizer que, até o momento, não verificamos nenhuma desvantagem que seja tão significativa para ser mencionada.

8- Considerações Finais

Não nos restam dúvidas de que o Sistema Integrado de Gestão alavanca oportunidades de melhoria contínua altamente expressivas para as empresas que o adotam. Devem ser encarados como verdadeiros desafios para a busca da criatividade e soluções simples, coerentes com a busca da inovação constante. Para nós da 3M do Brasil, inovar é questão de sobrevivência e um fator de diferencial nos mercados em que atuamos.