Julho/2002

Gestão da Qualidade

Os Primeiros Passos para a Atualização do Sistema da
Qualidade (2ª parte)

John R. Broomfield
Presidente e CEO da Quality Management International, Inc.

Determine o Escopo do Seu Sistema
O escopo (ou aplicabilidade) do Sistema de Gestão da Qualidade - SGQ - deve ser definido no Manual da Qualidade, mas tome cuidado ao fazer isso. O Comitê Técnico da ISO (TC 176) dá o seguinte conselho:

Convém que o escopo do SGQ seja baseado na natureza dos produtos da organização e dos seus processos de realização, no resultado da avaliação de riscos, nas considerações comerciais e nos requisitos contratuais, estatutários e regulamentares. (*)

Com a avaliação de riscos, é possível identificar os processos que devem ser incluídos no escopo do SGQ. A menos que você tenha sua própria metodologia (ex.: Análise de Modos de Falha e Efeitos da Falha [FMEA]), tente usar os seguintes critérios ao avaliar os riscos que poderiam ser enfrentados pelo seu SGQ:

1. Possíveis perdas (incluindo oportunidades perdidas).
2. Probabilidade de cada perda.
3. Probabilidade de reagir atenuando cada perda.
4. Gravidade e freqüência de cada perda (valor em Reais).

Multiplique as probabilidades dos itens 2 e 3 pelo valor determinado no item 4, para descobrir e classificar as perdas vitais a serem evitadas. Identifique os processos necessários para prevenir-se de tais perdas e inclua-os no SGQ e no seu escopo.
Ao estabelecer o escopo do SGQ, é importante avaliar a parte de serviços do produto, mesmo que a sua organização não preste "serviços" ao cliente. Na verdade, essa pode ser a oportunidade de você avaliar as interações com o cliente e tornar os serviços prestados em um elemento crucial do SGQ. Conforme mencionado anteriormente, a maioria das trocas de fornecedores resulta de um serviço ruim de atendimento ao cliente; assim, fazendo do atendimento ao cliente uma parte do SGQ, com o objetivo de buscar melhorias de desempenho ao longo do tempo, será mais fácil manter e aumentar sua base de clientes.
Se os processos de projeto são essenciais para fornecer um produto que atenda aos requisitos dos clientes e aos requisitos regulamentares, a organização que quiser reivindicar conformidade com a "ISO 9000" não mais poderá optar pela ISO 9002 para evitar a auditoria de seus processos. Essa alteração poderá significar um problema para organizações que recebem dos clientes projetos para equipamentos e materiais, programas de computador ou materiais processados, mas não para atividades de serviços relacionados ao produto.
Isso significa que a maioria das organizações não pode excluir a Seção 7.3, Projeto e Desenvolvimento, por ter o elemento "serviço" como parte de seus produtos, mesmo que isso inclua apenas as interações com o cliente? O esclarecimento apresentado no site do Subcomitê 2 do TC 176 não ajuda muito nesse sentido. Não há dúvidas, porém, de que futuramente, conforme aumentar a conscientização do povo, o serviço será invariavelmente parte do produto.
Por enquanto, a Seção 7.3 poderia ser excluída do escopo do SGQ com a justificativa de que o produto produzido não é projetado nem desenvolvido pela organização, e de que o projeto de serviços e outros processos relacionados ao produto são abrangidos por requisitos de outras seções. O projeto de serviços é especificado como parte do processo de realização do produto nas seguintes subseções:

  • 7.2.1, Determinação de Requisitos Relacionados ao Produto

  • 7.2.2, Análise Crítica dos Requisitos Relacionados ao Produto

  • 7.2.3, Comunicação com o Cliente

  • 7.5.4, Propriedade do Cliente

  • 7.5.5, Preservação do Produto


  • Esses processos especificados podem ser tudo de que você precisa para assegurar que os serviços fornecidos, juntamente com as mercadorias (mercadorias + serviços = produtos), atendam aos requisitos dos clientes. A partir dessa análise, é possível enxergar a necessidade de se incluir o projeto de serviços no escopo do SGQ; dessa forma, você não ficará tentando justificar a exclusão da Seção 7.3 (para projeto de serviços), mesmo que o cliente forneça-lhe o(s) projeto(s) para equipamentos e materiais, programas de computador e materiais processados.
    O TC 176 tem se preocupado com a imagem falsa de algumas organizações, que afirmam ser "certificadas" quando, na verdade, apenas uma parte de seu sistema é certificada. Com isso, um cliente pode ser iludido, achando que está negociando com "uma empresa certificada", e então sofrer as conseqüências desastrosas de um SGQ inadequado. Quanto a isso, o TC 176 aconselha:

    Caso a organização escolha implementar um SGQ de escopo limitado, convém que isso seja claramente definido no Manual da Qualidade da organização e em quaisquer outros documentos disponíveis ao público, a fim de evitar que os clientes e usuários finais sejam confundidos ou iludidos (isso inclui, por exemplo, documentos de certificação e material publicitário). (*)

    Justificando Exclusões
    Ao incluir todas as mercadorias e serviços no escopo do SGQ, você poderá achar que alguns requisitos da Seção 7 não se aplicam à sua organização. Isso pode ocorrer devido à natureza da organização e dos seus produtos ou processos de realização. Em tais circunstâncias, a organização poderá limitar a aplicação dos requisitos da ISO 9001:2000 de acordo com a Seção 1.2, Objetivo (Escopo) - Aplicação:

    Quando algum(ns) requisito(s) [da ISO 9001:2000] não puder(em) ser aplicado(s), devido à natureza de uma organização e seus produtos, isso pode ser considerado para exclusão. Quando forem efetuadas exclusões, reivindicação de conformidade com [a ISO 9001:2000] não será aceitável, a não ser que as exclusões fiquem limitadas aos requisitos contidos na seção 7 e que tais exclusões não afetem a capacidade ou responsabilidade da organização de fornecer produtos que atendam aos requisitos dos clientes e requisitos regulamentares aplicáveis.

    Note que a Seção 1.2 se aplica apenas às organizações que desejam reivindicar conformidade com a ISO 9001 e que, nesse caso, as exclusões são restritas aos requisitos da Seção 7. É possível excluir uma seção ou subseção inteira. Por exemplo, a Subseção 7.5.4, Propriedade do Cliente, pode ser totalmente excluída, caso a organização não possua qualquer propriedade (incluindo propriedade intelectual) que pertença ao cliente.
    Caso não possa aplicar certos requisitos da Seção 7, a organização deverá definir e justificar esse fato no Manual da Qualidade. Convém que todos os documentos disponíveis ao público, tais como documentos de certificação ou materiais publicitários, sejam cuidadosamente enunciados, a fim de evitar confundir ou iludir clientes e usuários finais com relação à aplicação dos requisitos da ISO 9001:2000.
    Assim sendo, não é possível reivindicar conformidade com a ISO 9001:2000 se a exclusão não for justificada no Manual da Qualidade, ou a omissão afetar a capacidade da organização de atender aos requisitos dos clientes (mesmo que isso não seja exigido pelos organismos regulamentares). O TC 176 adverte também que a conformidade com a ISO 9001 não pode ser reivindicada mesmo que a organização esteja em conformidade com as normas suplantadas ISO 9001:1994 ou ISO 9001:1987!

    Incluindo Processos Terceirizados
    Se uma organização depende da terceirização, qual o efeito disso sobre o SGQ e o escopo? A Seção 4.1, Sistema de Gestão da Qualidade - Requisitos Gerais, declara:

    Quando uma organização opta por adquirir externamente [terceirizar] algum processo que afete a conformidade do produto em relação aos requisitos, a organização deve assegurar o controle desses processos. O controle dos processos deve ser identificado no sistema de gestão da qualidade.

    Mais uma vez, o TC 176 dá orientações, destacando-as em negrito, sobre como a terceirização deve ser tratada:

    Quando toda a responsabilidade pela realização de produtos pertence a uma organização, o fato de se terceirizar (ou "subcontratar") um processo específico de realização de produtos não se constitui uma justificativa adequada para excluir o processo do SGQ. (*)

    A organização deve mostrar que exerce controle suficiente para assegurar que tais processos sejam executados de acordo com os requisitos pertinentes da ISO 9001:2000. A natureza desse controle dependerá da natureza do(s) processo(s) terceirizado(s) e riscos envolvidos.
    Assim sendo, convém que a organização especifique, como parte dos requisitos para o SGQ do fornecedor, a forma como será realizada a validação de processos, ou indique que serão conduzidas inspeções, verificações ou auditorias do local. Nesse caso, a organização deveria seguir a Seção 7.4, Aquisição, da ISO 9001:2000, quanto à seleção de fornecedores e especificação e monitoramento dos processos terceirizados.
    Nessas circunstâncias, convém que a organização inclua tais processos no escopo do SGQ e deixe claro, no Manual da Qualidade e em quaisquer outros documentos disponíveis ao público, que o SGQ abrange a "gestão" dessas atividades terceirizadas ou subcontratadas, pelas quais a organização é totalmente responsável.
    A tarefa que costumava levar poucos minutos - escrever um escopo - se tornou muito mais complicada, e com razão. Com a avaliação de riscos, será possível assegurar-se de que o SGQ esteja ajudando a equipe a evitar as perdas mais significativas (incluindo perdas devido a um serviço ruim) e prevenir-se de apresentar uma imagem falsa quanto à certificação. Isso também sugere que a "avaliação de riscos para evitar perdas" poderia ser incluída no SGQ como um processo essencial. O escopo de uma organização aparece em seu certificado (caso o SGQ seja certificado) e possivelmente em seus folhetos, devendo ficar gravado na mente de possíveis clientes, quando estes estiverem procurando por uma organização confiável com a qual negociar.
    Para concluir, certifique-se de que a sua equipe esteja familiarizada com os novos requisitos e seja competente para analisar os processos que fazem parte do SGQ da empresa. Reavalie o escopo do seu SGQ. Essa á a maneira de se estabelecer, logo no início da transição, um SGQ correto e baseado em processos, com o qual a sua organização possa lucrar.

    (*) Secretaria do ISO/TC 176/SC 2. ISO 9000 Introduction and Support Package: Guidance on ISO 9001:2000 Clause 1.2 "Application", Documento ISO/TC 176/SC 2/N 524R3, 13 de fevereiro de 2002 (faça o download do documento no Portal QSP de Informações).

    Texto traduzido por Marily Tavares Sales, do QSP.

    A Divisão de Consultoria e Auditoria do QSP tem assessorado diversas empresas na implantação e avaliação de Sistemas de Gestão da Qualidade baseados nas normas ISO 9000. Solicitações de serviços de consultoria, auditoria e treinamentos in company: consultoria@qsp.org.br