Dezembro/2002 Excelência Empresarial
O VALOR-CLIENTE NA ERA DO CONHECIMENTO Sueli Rodrigues* De alguns anos para cá, pressionadas pelo Código de Defesa do Consumidor e pegando carona na onda “pró-cliente”, muitas empresas lançaram mão de algumas ações: contrataram um desses pacotes prontos de treinamento em Atendimento a Clientes para seu pessoal, implantaram um SAC (ou melhor dizendo: “improvisaram” um SAC...) e espalharam aqueles típicos banners em seus escritórios, fábricas ou estabelecimentos comerciais: “Nossa missão é atender o cliente.....”, “Aqui, o cliente tem sempre razão”. Nos primeiros tempos, isso fez muito sentido e até trouxe algum resultado. Porém, com o amadurecimento do consumidor e com as várias transformações da sociedade, das organizações e do marketing, essas ações já não se mostram suficientes.Num momento em que há consumidora trocando sua marca preferida de açúcar (preferência essa passada de mãe para filha há várias gerações) por outra marca que, além de qualidade, explicita seu compromisso social, sua responsabilidade ambiental, sua ética etc, as empresas que não trazem o Valor-Cliente em sua essência, cedo ou tarde se revelarão ao mercado “pão bolorento”, sendo incapazes de competir com as marcas consideráveis pelo consumidor e jamais estarão no “Top of Mind”. O que é preciso entender é que, neste mundo globalizado, de competição acirrada, de cenários incertos, de mudanças inesperadas e em alta velocidade, a única garantia de construção de lucro sólido para as empresas é a sua carteira de clientes leais. A tecnologia populariza padrões de última geração e os torna obsoletos da noite para o dia, desafiando constantemente o posicionamento e até a perenidade das companhias. Boas estratégias de produto, liderança de preços, eficiência operacional, logística de distribuição e outros, que antes representavam fatores críticos de sucesso e conferiam à empresa uma vantagem competitiva imbatível, hoje tendem a se transformar em commodities; são facilmente copiáveis pela concorrência – uma concorrência que pode surgir na próxima esquina ou vir do outro lado do mundo, quando menos se espera. E pior: uma concorrência que pode vir explicitamente de um player que atue no mesmo mercado, ou, implicitamente, de um agente da sua cadeia de valor, um fornecedor, um colaborador ou até mesmo um cliente! Assim, na Era do Conhecimento, a real vantagem competitiva de uma organização está:
E essa relação sólida deve ser fundamentada no “Valor-Cliente”. Mas, como incorporar e permear em todos os funcionários e colaboradores esse valor? Acreditamos que, primeiro, é preciso “desnudar’ a organização para refletir sobre a sua essência, traduzida nos valores que preconiza e que efetivamente pratica. Segundo, é necessário estar disposto e ter fôlego, para, talvez, rever tudo o que já foi construído e investir em inovação. Afinal, só conseguimos colocar água limpa dentro do copo cheio se jogarmos a água suja. Assim, um efetivo programa nesse sentido deve começar com um trabalho simultâneo de identificação de valores, tanto da organização como dos clientes. Esse é um exercício bastante desafiador. Os valores da organização expressam muito as crenças de seus donos e dirigentes, que são passados aos funcionários pelos procedimentos exigidos, pelo tipo de liderança exercida... E valor é muito particular, é algo que está ligado àquilo em que se acredita, que por sua vez sofre influência de uma série de variáveis, ligadas à história de vida, experiências vividas etc. Muitas vezes, as pessoas têm até dificuldade em verbalizar seus valores. É preciso saber extraí-los e consolidá-los numa única lista, que atenda aos dois lados: empresa e cliente. Com isso feito, o passo seguinte é revisar a Missão, Visão, Princípios e Políticas da Organização, alinhando-os aos valores coletados. Nesse momento, surgem muitos pontos incongruentes e afiná-los irá, por certo, requerer alguns “sacrifícios” – como, por exemplo, reestruturar determinada área da empresa para atender a alguns valores dos clientes, recapacitando colaboradores e, às vezes, até substituindo aqueles que não se adaptam. Ou, por outro lado, abrir mão de certo nicho de mercado pela impossibilidade de atender aos valores de todos os clientes. Em seguida, parte-se para a materialização desses valores na organização. É preciso rever objetivos, estratégias, produtos, serviços, competências, procedimentos praticados etc. Depois, identificar os pontos nevrálgicos e fazer os ajustes necessários. Só depois disso é estabelecido o Programa de Educação – sim, porque qualquer treinamento nesse campo deve ter o porte de um programa intenso e continuado. Não estamos falando só em melhorar o atendimento ao cliente, mas em imprimir uma nova cultura na organização. E não se mudam as pessoas da noite para o dia. Além disso, o consumidor está constantemente mudando, as regras do mercado idem, o conhecimento se renova em questão de meses e assim vai. Esse Programa deve ser estabelecimento em conjunto com ações de incentivo atreladas ao desempenho, que deve ser medido por instrumentos formais, considerando, sobretudo, o atendimento aos valores do cliente e não apenas seu nível de satisfação. Somente a partir daí é que deve ser implementada uma estratégia de relacionamento com clientes. Algumas empresas estão tentando queimar etapas, instalando de pronto sistemas de CRM, por exemplo. Correm o risco de perder muito dinheiro, já que o Customer Relationship Management tem como pré-requisito a cultura pró-cliente instalada e permeada em toda a empresa. Trata-se de um bom caminho a percorrer. E que, mais cedo ou mais tarde, terá que ser percorrido. Ainda mais agora, com a ISO 9001:2000... ____________________________ (*) Sueli Rodrigues é consultora em cultura de relacionamento com clientes e também ministra treinamentos sobre esse tema. Contatos: consultoria@qsp.org.br.
|