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Março/2007

 

INOVAÇÃO EM SERVIÇOS
(White Paper - parte 2/4)

Alexis P. Goncalves
Director, Customer Experience
Citigroup - Global Consumer Group
Nova York, EUA. 
Membro do Conselho Curador do QSP.

 

A inteligência sobre o cliente é a chave que abre a cadeia de valor de uma organização de serviços. Ela permite que as organizações identifiquem requisitos críticos para o cliente e executem ações com base nessa inteligência. A inteligência sobre o cliente gera um discurso unificado que abarca as áreas de marketing, vendas e serviços e alcança a mídia e os canais de distribuição. Possui três componentes básicos. Cada um desempenha um papel integral nas seguintes atividades: (a) criação de capital intelectual referente aos clientes e ao mercado; e (b) sustentação do desenvolvimento da inteligência sobre o cliente. As três abordagens básicas para desenvolver a inteligência sobre o cliente são:

(1) Monitoramento do Patrimônio da Marca (desenvolver inteligência quanto à forma de incrementar a experiência do cliente com a marca)
(2) Medição da Satisfação e da Fidelidade do Cliente (desenvolver inteligência quanto aos principais geradores de satisfação e fidelidade do cliente)
(3) Gestão de Dados nos Pontos de Contato (desenvolver inteligência sobre os clientes por meio de coleta, compilação e análise de dados secundários dos clientes, isto é, aprender com cada interação feita com o cliente).

 

(1) Monitoramento do Patrimônio da Marca

O patrimônio da marca está vinculado ao nome da marca e pode agregar (ou subtrair) valor a um produto ou serviço. Esse patrimônio pode ser agrupado em quatro dimensões: conscientização da marca, qualidade percebida, associações da marca e fidelidade à marca (Davis, 2002). Essas quatro dimensões são influenciadas através dos seguintes fatores: da experiência direta, do contato verbal, do momento da verdade com a marca e com diversas atividades de marketing. Por essa razão, o monitoramento do patrimônio da marca é vital para o seu sucesso. Ele permite que os donos da marca vejam quais são os pontos fortes e fracos da marca e que forças estão impulsionando-os, o que, por sua vez, aponta para a natureza e o nível de inovação necessária para desenvolver o potencial da marca.

Entendendo a força da relação do cliente com a marca, pode-se começar a desenvolver um sistema de inteligência sobre os clientes e aferir a vulnerabilidade da marca quanto a novos concorrentes ou promoções de curto prazo, bem como o nível de inovação necessário para aumentar a fidelidade à marca.

Vários modelos patenteados baseados em pesquisas de mercado mundiais têm sido desenvolvidos para monitorar o patrimônio da marca e avaliar oportunidades de inovação da marca. Esses modelos podem ser agrupados em duas categorias: modelo "voltado para o consumidor" ou modelo de "medidas de desempenho empresarial" (Davis, 2002). O modelo mais usado ("voltado para o consumidor") se baseia na percepção do cliente e consiste em usar um questionário que mede quatro áreas principais:

a. Diferenciação: A marca se destaca no mercado?
b. Relevância: Qual a relevância da marca para o consumidor?
c. Estima: O consumidor tem a marca em alta conta?
d. Conhecimento: O consumidor sabe bem o que representa a marca?

Os pontos em relação às dimensões "diferenciação" e "relevância" são agrupados para produzir uma medida da força da marca. Os pontos em relação às dimensões "estima" e "conhecimento" são agrupados para produzir uma medida da estatura da marca. Essa abordagem se concentra no consumidor, à custa das medidas mais voltadas para a empresa, como participação no mercado ou tendências de vendas.

É importante notar, porém, que não há uma única forma correta de avaliar o patrimônio da marca e identificar o nível de inovação necessária. Em vez disso, deve-se reunir, analisar e priorizar as várias dimensões num processo estruturado de monitoramento e considerá-las como um todo na avaliação do patrimônio da marca. O resultado do processo de monitoramento do patrimônio da marca deve ser a identificação de oportunidades para inovar e melhorar a experiência total do cliente.

Atualmente, as empresas de serviços estão lentamente percebendo que a experiência do cliente está por trás do valor da marca. As interações e/ou transações de rotina que ocorrem entre o cliente e a empresa de serviços (também conhecidas como momento da verdade) causam um profundo impacto na imagem da marca e na fidelidade a ela. Os clientes sempre têm alguma experiência quando interagem com uma organização. Consciente e inconscientemente, eles filtram uma enxurrada de "imagens da marca" e as organizam num conjunto de impressões, tanto racionais como emocionais. Qualquer coisa percebida ou sentida (ou reconhecida devido à sua falta) é uma experiência relacionada com a marca. Se é algo que você pode ver, cheirar, provar ou ouvir, é uma experiência relacionada com a marca. Os serviços, assim como o ambiente físico no qual eles são oferecidos, produzem experiências desse tipo. Os funcionários são uma outra fonte de experiência relacionada com a marca. Cada experiência dessa contém uma mensagem; o composto de experiências relacionadas com a marca gera a experiência total do cliente. Muitas organizações grandes de serviços gastam quase 50% menos em atividades relacionadas com a experiência do cliente do que em publicidade. Esse desequilíbrio provém de uma compreensão equivocada do papel da marca, que consiste em acreditar que ela deve ser divulgada e considerá-la como uma despesa a ser administrada.

No setor de serviços financeiros, alguns bancos estão inovando. Bancos com um ambiente de alta tecnologia estão usando o sistema de inteligência sobre os clientes e investindo pesado na experiência do cliente nos diversos canais de distribuição (Swan, 2003; Conley, 2005; Moore, 2005; Salter, 2002). Os bancos têm se esforçado extremamente para reposicionar sua marca e cumprir com as suas promessas. Por exemplo, muitos prometem conveniência e, depois, deixam os consumidores frustrados e desmotivados com sua experiência real. Suponha que um consumidor tenha que escolher entre dois bancos. O banco com a marca mais valiosa não ganhará automaticamente. O consumidor reagirá a uma série de questões emocionais e pragmáticas: É conveniente? É o mesmo banco que meu amigo usa? Os funcionários desta filial explicam as opções de conta corrente com clareza? O banco entende minhas necessidades?

(2) Medição da Satisfação e da Fidelidade do Cliente

A prática de medir regularmente a satisfação e a fidelidade do cliente é fundamental para o desenvolvimento de um sistema de inteligência sobre os clientes e a identificação de oportunidades para inovação. As organizações de serviços que dominam essa prática têm descoberto duas coisas: (a) que há uma relação entre a satisfação e o comportamento e (b) que essa relação não é linear. Em vez disso, a "curva de satisfação-fidelidade" parece ser não-linear e assimétrica (Reichheld et al., 1996). Em outras palavras, o impacto da mudança da satisfação do cliente sobre a intenção de recompra, a fidelidade do cliente, a sensibilidade ao preço e assim por diante é extremo (isto é, extrema insatisfação ou extrema satisfação). Há os atributos que contribuem para a insatisfação, também conhecidos como "qualidade essencial", e os atributos que contribuem para uma grande satisfação, conhecidos como "qualidade atraente" (Walden et al., 1993). Na parte intermediária da curva, é improvável que as mudanças na satisfação do cliente façam diferença na sua fidelidade. De fato, muitas empresas de serviços têm descoberto que a satisfação do cliente não causa um impacto notável no comportamento - exceto quando os clientes estão excepcionalmente insatisfeitos e, portanto, mais motivados para buscar alternativas e trocar de fornecedor, ou quando os clientes estão excepcionalmente satisfeitos (geralmente com algum aspecto em que a organização tenha dado início a algum tipo de "excelência em serviço") a ponto de o "encanto" ser traduzido em fidelidade.

É importante que as empresas de serviços percebam que os índices de satisfação revelam apenas um dos vários componentes que geram o valor percebido e o comportamento do cliente. Isso explica por que as mudanças incrementais na satisfação podem não mudar de forma alguma o comportamento do cliente. Por exemplo, há contextos em que clientes relativamente insatisfeitos podem permanecer com um fornecedor apesar da falta de satisfação (se, por exemplo, eles não acham que as ofertas dos concorrentes são melhores ou proporcionam maior valor ou se é muito difícil trocar de fornecedor). Por outro lado, uma cliente que está muito satisfeita com o serviço prestado em seu banco local pode, contudo, fazer seu investimento em qualquer outro lugar para conseguir uma melhor taxa de hipoteca. Ela pode ainda comprar seus produtos de investimento de um terceiro banco se perceber que a firma é mais sofisticada e melhor para aconselhar. E ela pode abrir uma conta com um quarto banco por ser conveniente e perto do seu trabalho e por acreditar que será prestado o mesmo nível de serviço de seu principal banco.

O que mais compele uma organização a medir a satisfação e a fidelidade do cliente é o fato de que isso lhe permite: (a) conduzir uma análise abrangente dos clientes e do mercado e (b) priorizar as oportunidades de inovação que estão vinculadas a impulsionadores de fidelidade. Veja a seguir alguns exemplos de organizações de serviços que estão usando a medição da satisfação e fidelidade do cliente para desenvolver um sistema de inteligência sobre os clientes, inovando e proporcionando novo valor para seus clientes.

Certo banco, situado no Centro-Oeste dos Estados Unidos, desenvolveu um sofisticado sistema para rastrear vários fatores envolvidos na fidelidade e satisfação do cliente. Antes movido estritamente por medidas financeiras, conduz agora trimestralmente medidas da retenção de clientes, do número de serviços usados por cada cliente e do nível de satisfação dos mesmos. As estratégias provenientes dessas informações ajudaram o banco a identificar oportunidades de inovação e criação de novo valor. Isso explica por que a empresa alcançou mais do que o dobro do retorno sobre o patrimônio total que seus principais concorrentes (Heskett et al., 1994).

Todo mês, uma locadora de carros fazia uma pesquisa com seus clientes usando apenas duas perguntas simples - uma sobre a qualidade de sua experiência em locação e a outra sobre a probabilidade de eles usarem novamente os serviços de locação da empresa. Como o processo era muito simples, também era rápido. Isso fez com que a empresa publicasse os resultados para suas 5.000 filiais americanas em poucos dias, dando-lhes um retorno em tempo real quanto ao seu desempenho e ajudando a corporação a identificar oportunidades de inovação e criação de novo valor (Reichheld, 2003).

Uma empresa de arrendamento mercantil desenvolveu ferramentas multifuncionais para ouvir os clientes, bem como instrumentos de medição da satisfação. As pesquisas são personalizadas pela Divisão (de acordo com o tipo de cliente) e incluem pesquisas voltadas para o usuário, para a concessionária e para os concorrentes. A empresa elevou o nível de satisfação dos clientes de forma significativa. Os resultados são agregados no ISC (Índice de Satisfação do Cliente), o qual é um índice de multi-atributos usado para avaliar os níveis de satisfação. A análise de fatores determina a satisfação quanto aos processos básicos. A análise de regressão múltipla determina a importância de cada fator para a satisfação do cliente no geral. Os resultados são segmentados e analisados pelo processo e pelo segmento de mercado. Os donos de processo e as equipes Seis Sigma usam os dados para identificar oportunidades de inovação e aumentar a percepção dos clientes quanto ao valor proporcionado (NIST, 2003).

(3) Gestão de Dados nos Pontos de Contato

As pesquisas de monitoramento do patrimônio da marca e medição da satisfação e da fidelidade do cliente são boas abordagens para ouvir a voz do cliente e identificar oportunidades de inovação. Contudo, não são suficientes. As empresas de serviços devem reagir e, em alguns casos, fazer mudanças (isto é, inovar), caso o que for ouvido indique problemas ou oportunidades. Gerenciar dados nos pontos de contato significa desenvolver o sistema de inteligência sobre os clientes com base em informações prontamente disponíveis de clientes, e que geralmente estão espalhadas por vários canais ou pontos de contato. É muito comum as empresas de serviços não fazerem uso de dados já existentes, que poderiam ser usados para identificar oportunidades de inovação. Gestão de dados nos pontos de contato é uma boa metáfora para o ato de peneirar e classificar informações de clientes armazenadas em vários bancos de dados. O propósito dessa gestão é apontar tendências, relacionamentos e outras porções de informações e opiniões de clientes, a fim de identificar melhores oportunidades de inovação. Os bancos de dados são a principal ferramenta usada para gerenciar relacionamentos com clientes - atividade ou programa às vezes chamado de gestão de relacionamento com o cliente (ou CRM). O programa CRM começou como uma ferramenta para ajudar a força de vendas a rastrear os clientes e as perspectivas, mas, com o passar do tempo, tornou-se mais estratégico e mais focado no cliente.

É nessa gestão de dados que muitas organizações de serviços tendem a tropeçar, principalmente as firmas de múltiplas linhas de produto. Motivo: suas atividades de vendas, marketing, operações e serviços são "armazenadas" em torno de produtos e não em torno de clientes, que são cruciais para o sucesso da firma (Peppers et al., 2004). Como resultado, o sistema de inteligência sobre os clientes é fragmentado e limitado, e a capacidade para entender a experiência total do cliente fica comprometida.

A fim de desenvolver o sistema de inteligência sobre os clientes por meio dos pontos de contato e identificar oportunidades de inovação, as empresas de serviços devem conduzir uma extensa análise de dados secundários e buscar informações existentes de clientes por toda a organização - isto é, unidades de vendas, marketing, serviço de atendimento ao cliente, suporte pós-vendas e qualquer outro grupo interno de contato com o cliente. Nessas áreas ou unidades, as informações do cliente podem ser armazenadas em diferentes formatos ou mídia, como bancos de dados eletrônicos (ex.: sistemas CRM como Seible, SAP, Peoplesoft) ou mesmo pastas e formulários. Nesse tipo de análise, pode-se usar programas de computador especiais para fazer varreduras periódicas no banco de dados de clientes e indicar quando a quantidade de reclamações, perguntas ou cumprimentos recebida num certo período estiver acima da média. Essa quantidade crítica irá variar dependendo do tamanho da base de clientes e da categoria de produtos ou serviços. Note que o banco de dados de clientes deve captar todas as interações (não apenas as vendas) em que há contato com clientes, administradas por qualquer ponto de contato nas unidades de marketing, serviço de atendimento ao cliente, suporte pós-vendas e qualquer outro grupo da firma que tenha contato com o cliente.

Perguntas excessivas sobre um serviço ou assunto, do tipo "Como posso calcular as taxas de juros do meu contrato de empréstimo?" ou "Minha multa por atraso já foi cancelada?", indicam que é necessário disponibilizar mais informações aos clientes ou reprojetar o serviço de forma a estimular menos perguntas sobre seu uso. Certa empresa de seguro de automóveis conduziu uma análise de exceções de seu banco de dados e descobriu que estava recebendo milhares de ligações por mês de clientes potenciais dizendo que gostariam de saber sobre os juros da empresa em comparação com a concorrência. Após uma discussão entre a equipe da alta direção, a empresa decidiu adotar a "transparência de informações", política que consistia em compartilhar com os clientes (ou possíveis clientes) informações sobre preços, custos e serviço. O serviço "0800" da empresa, por exemplo, menciona suas próprias taxas para clientes potencias juntamente com as taxas de concorrentes, mesmo que elas sejam menores (Salter, 1998). Alguns não acreditam que a empresa faça isso, pensam que é um estratagema. Mas faz parte de sua política de "transparência de informações". Pode ser que ela perca alguns clientes que optem por taxas mais baixas, mas a empresa acredita que a transparência manterá os outros clientes por perto, produzirá fidelidade e estabelecerá um sentimento de confiança na empresa. Num setor tão famoso por preços altos, burocracia exagerada e serviço ruim, esse é um importante patrimônio da marca.

Quando, num dado período, é registrada uma quantidade de elogios acima da média, a empresa deve examiná-los para ver se estão relacionados com algum benefício do serviço, que possa ser potencializado nas mensagens de divulgação da marca. Os elogios recebidos de clientes também devem ser transmitidos às áreas de operações e prestação de serviços como forma de reconhecer o bom trabalho e elogiar os funcionários. Elevar o moral dos funcionários melhora o serviço de atendimento ao cliente e diminui o número de defeitos nos serviços.

Todas as organizações de serviços, por pior que sejam, sempre recebem algum tipo de elogio. O que é crucial, porém, é notar se estão recebendo demasiados elogios por um serviço ou produto em particular. Relatórios sobre queixas e reclamações servem como alerta. As queixas e reclamações indicam que os serviços ou métodos usados pela empresa para gerenciar clientes são falhos ou que as expectativas dos clientes não estão sendo devidamente administradas. Gerenciar expectativas é uma das principais responsabilidades da área de marketing e operações.

A gestão de dados nos pontos de contato pode ser usada em cada estágio de relação com a marca: conquista de clientes, aprofundamento (up-sell) de relacionamento, ampliação de relacionamento (cross-sell), retenção e reconquista (recuperação de clientes perdidos). Provavelmente, um dos estágios mais críticos para as empresas de serviços é o estágio de retenção e reconquista. Os clientes desistem de uma marca por várias razões. Os programas de retenção e reconquista podem minimizar uma grande perda, mas requerem uma boa capacidade para ouvir e aprender.

Certa empresa de cartão de crédito adotou uma abordagem interessante para minimizar o volume de clientes perdidos. Ela não apenas desenvolveu uma forte capacidade analítica para predizer o comportamento dos clientes e prever a deserção, mas também possui uma estratégia desenvolvida com executivos seniores para entender a causa-raiz dos problemas e aprender com a deserção de clientes. Cada um gasta quatro horas por mês numa sala especial monitorando as ligações rotineiras do serviço de atendimento ao cliente, bem como as ligações de clientes que cancelam o cartão de crédito (Reichheld and Sasser, 1990). Isso mostra uma verdadeira liderança e um compromisso visível com a gestão de dados de pontos de contato.

II. Intimidade com o Cliente

Abordagem da empresa visando a obter intimidade com seus clientes e estabelecer uma relação que possibilite a co-criação e o co-projeto de novos serviços e produtos.

Conforme descrito anteriormente, o sistema de inteligência sobre os clientes é o ponto de partida para se desenvolver um capital intelectual referente aos clientes e identificar oportunidades para inovar e melhorar a experiência do cliente. Contudo, embora esse sistema de inteligência seja um elemento necessário para a inovação, não é suficiente. É preciso ir além das informações sobre os clientes e conquistar intimidade com o cliente, isto é, um relacionamento íntimo e confiável, para entender melhor suas necessidades. A palavra "intimidade" provém do latim intimatus - tornar algo conhecido a alguém. No sentido original, intimidade não significa proximidade emocional, mas disposição para transmitir informações sinceras.

A intimidade com o cliente é favorecida por uma orientação com foco no mercado. Isso implica em aprender sobre as necessidades dos clientes, a influência da tecnologia, a concorrência e outras forças ambientais, e agir de acordo com esse conhecimento, a fim de se tornar competitivo. Assim, a orientação com foco no mercado é uma capacidade de aprendizagem organizacional que consiste de associações cognitivas (ex.: crenças, valores e normas em comum) e resultados comportamentais que reflitam essas cognições (Kok et al., 2002).

Sob esse aspecto, as empresas de serviços devem se tornar organizações de aprendizagem, isto é, firmas que dominem o aprendizado organizacional, a fim de desenvolver intimidade com o cliente. Esse aprendizado é muito útil para uma organização de serviços e para seus clientes porque ajuda a dar suporte à compreensão e à satisfação das necessidades latentes dos clientes, por meio de novos produtos, serviços e formas de se fazer negócio. O aprendizado organizacional possibilita não apenas criar produtos mais avançados do que os dos concorrentes, mas também criá-los antes do reconhecimento de alguma necessidade explícita do cliente.

Segundo Peter Senge, que popularizou esse conceito (Senge et al., 1994), o aprendizado organizacional envolve dois tipos distintos de comportamento: adaptativo e generativo. O aprendizado adaptativo focaliza a adaptação da organização para atender o mercado presente. Com um foco contínuo no mercado, é possível que essas capacidades básicas dominem a direção e o desenvolvimento da empresa e, então, a constranjam, inibindo a inovação. Em contraste, o aprendizado generativo exige que a organização desafie seus próprios pressupostos quanto à sua missão, clientes, concorrentes e estratégia. Se uma empresa é capaz de ver em seu ambiente além dos pressupostos familiares, pode descobrir novas direções e novas possibilidades e, assim, criar novos serviços inovadores. Os aprendizados adaptivo e generativo são elementos-chave para o desenvolvimento da intimidade com o cliente. A seguir, estão descritas três abordagens para fomentar o aprendizado e aumentar a intimidade com o cliente:

(4) Entrosamento com o Cliente (integrar os clientes com a empresa e ajudar a criar soluções para melhorar a economia dos clientes)

(5) Mapeamento da Mente do Cliente (entender o inconsciente dos clientes e extrair metáforas dos clientes)

(6) Mapeamento do Ecossistema do Cliente (expandir serviços e soluções de forma a fazerem parte da cadeia de valor do cliente para melhorar a economia do sistema)

(4) Entrosamento com o Cliente

A lógica do entrosamento com o cliente está na assimetria (ou independência) das informações, pois as informações referentes às "necessidades" (o que o cliente quer) encontram-se com o cliente, e as informações referentes às "soluções" (como satisfazer essas necessidades) acham-se com o prestador de serviços. Implícito nessa idéia está o pressuposto de que as informações necessárias para reduzir a incerteza com relação ao novo processo de desenvolvimento de serviços existem e estão de posse do cliente. Logo, o desenvolvimento de serviços seria apenas uma questão de descobrir onde estão localizadas as informações necessárias e encaminhá-las a partir de onde estão para onde deveriam estar.

O entrosamento com o cliente enfatiza a interação com os clientes ou usuários líderes como uma abordagem eficaz de inovação, isto é, como forma de alcançar uma curva de custo/tempo de desenvolvimento de serviço mais favorável e reduzir a incerteza que geralmente circunda o processo de inovação. Entrosar-se com os clientes ou usuários líderes é um fator crucial no processo que consiste em fazer com que a inovação seja desenvolvida e aceita no mercado. Os clientes ou usuários líderes são fontes de informação e conhecimento, e o fato de interagir com eles pode aumentar a eficácia do conceito de serviço. Com respeito ao envolvimento do cliente no processo de inovação das empresas, os pesquisadores identificaram cinco funções que ele pode desempenhar: "recursos", "coprodutores", "compradores", "usuários" e "produtos" (Prahalad et al., 2002; Lundkvist et al., 2004). Enquanto os dois primeiros fazem parte das entradas do processo de criação de valor, os três últimos ocorrem na saída do processo. Entrosar-se com os clientes ou usuários líderes para inovar é uma prática que pode ter diferentes nomes. Numa empresa, ela é chamada de "sessões de sonho" (GE, 2004); no Citigroup, é chamada de "sessões de entrosamento com o cliente"; e outros nomes comuns são: "sessões de laboratório com o cliente", "sessões de diálogo com o cliente", "sessões de simbiose com o cliente", "abrindo o quimono com o cliente" e "sessões de mapeamento do cenário do cliente" (Seybold et al., 2001; Sharma et al., 2002).

Para ser eficaz e criar novo valor, o processo de inovação deve ser uma interação com diferentes atores externos, principalmente com os clientes (usuários líderes), mas também com os fornecedores, subcontratados, distribuidores e outros membros da cadeia de valor. Tradicionalmente, as empresas de serviços têm inovado enviando pesquisadores de mercado para descobrir "necessidades não atendidas" entre os clientes. Depois que a pesquisa é concluída, a organização decide quais idéias desenvolver e as entrega para uma equipe de desenvolvimento de projeto. Estudos sugerem que cerca de três quartos desses projetos falham (Von Hippel, 1999 and 2002). Para descobrir uma inovação, são necessários diferentes métodos. Algumas empresas de serviços, em vez de analisarem uma grande amostra de clientes, identificam os poucos clientes especiais que buscam inovação. Esses clientes são chamados de usuários líderes. São parceiros perfeitos para se entrosar e ajudar na criação de soluções. Uma empresa no setor de saúde chama-os de "iluminados". Segundo a empresa, geralmente os "iluminados" são cientistas pesquisadores e médicos renomados de instituições médicas proeminentes. Nas sessões regulares do conselho médico, chegam a se reunir 25 iluminados para discutir a evolução de sua tecnologia. A empresa então partilha algumas de suas tecnologias avançadas com um subconjunto de iluminados que formam um "círculo sagrado de bons amigos". Os produtos da empresa surgem então da colaboração com esses grupos (Von Hippel, 2005).

Certo varejista de suprimentos de escritório descobriu seus iluminados por meio de uma competição realizada entre clientes para propor novas idéias de produto. A competição, denominada "Em Busca de uma Invenção", é uma iniciativa para descobrir um próximo produto genial. Em 2004, foram feitas 8.300 propostas. O vencedor foi um cadeado cuja combinação constitui-se de letras de palavras fáceis de lembrar, e não de números (McGregor, 2004).

Em uma unidade do Citigroup, a equipe de projeto de usuários líderes é formada por gerentes de relacionamento e diretores de produto. São usados dois métodos básicos de transferência de informações. Primeiramente, são usadas entrevistas e visitas a usuários líderes previamente identificados. Geralmente, são diretores ou gerentes do departamento financeiro da organização-cliente (ex.:diretores e gerentes financeiros, tesoureiros, gerentes de finanças e de comércio exterior, diretores e gerentes comerciais e de vendas, entre outros). Em segundo lugar, são convidados alguns usuários líderes (6 a 8) que parecem ter idéias e opiniões bastante promissoras, para participar de um workshop conjunto para a resolução de problemas com membros da equipe de projeto multidisciplinar do Citigroup, que inclui não apenas gerentes de relacionamento e diretores de produto, mas também gerentes de operações, gestão de riscos e tecnologia. Esses workshops normalmente duram de 1 a 2 dias. Durante esse tempo, os usuários líderes e a equipe multidisciplinar unem-se todos no trabalho de resolução de problemas de negócio, que consiste em projetar uma ou mais soluções financeiras que se adaptem exatamente às necessidades da organização cliente.

A tendência de entrosamento com os clientes em busca de inovação pode ser vista em todo o setor de serviços, desde os serviços de software e informação até os serviços de saúde, consultoria e transações bancárias. Quanto mais freqüente e intensa a comunicação entre as diversas partes envolvidas (isto é, empresas, clientes, usuários líderes e outros membros da cadeia de valor), mais provável a ocorrência de inovações substanciais. Obviamente, a adoção de medidas apropriadas, que promovam uma cultura baseada em confiança entre a equipe de desenvolvimento de novos serviços da empresa e os clientes, exige uma mudança cultural - de uma atitude do tipo "sabemos tudo" para uma atitude que considere a idealização de produtos como o resultado conjunto de um processo de entrosamento com o cliente.

(continua na próxima edição do "Últimas Notícias" do QSP)

Bibliografia para esta 2ª Parte

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2. Swan, Kate (2003), “Bank of (Middle) America”, Fast Company magazine,
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24. McGregor, Jena (2004), “The World Is Their R&D Lab”, Fast Company
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Tradução:Marily Sales dos Reis.
QSP, 2007.